Acessibilidade no cinema para pessoas com deficiência auditiva
Apesar das tecnologias disponíveis, a falta de acessibilidade nos cinemas ainda impede que milhões de pessoas com deficiência auditiva desfrutem plenamente dos filmes nacionais
No Brasil, cerca de 4,6 milhões de pessoas têm algum grau de deficiência auditiva. No entanto, quando se trata de acessibilidade no cinema, uma parte significativa desse público ainda enfrenta barreiras para acessar filmes nacionais de forma completa. Apesar dos avanços da acessibilidade no cinema, recursos como legendas descritivas, audiodescrição e Libras (Língua Brasileira de Sinais) ainda não estão presentes de maneira consistente nas salas de cinema, deixando muita gente de fora.
“Eu desisti de tentar ver filmes nacionais no cinema”
Rodrigo Pontes, de 37 anos, nasceu com deficiência auditiva e tem perda total de audição do lado direito. Para ele, a experiência de ir ao cinema nunca foi a mesma que para uma pessoa ouvinte. “Nunca tive uma experiência boa assistindo filmes brasileiros, só filmes estrangeiros legendados“, conta.
O problema, segundo Rodrigo, não é apenas a ausência de legendas nos filmes nacionais, mas também a dificuldade de entender diálogos quando os atores falam rápido ou baixo. “Muitas vezes, eu ia ao cinema esperando que o filme tivesse legenda, mas chegava lá e não tinha. Isso aconteceu tanto que simplesmente desisti de tentar assistir a filmes brasileiros no cinema“, ele explica.
E Rodrigo não está sozinho. De acordo com um estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2024, cerca de 5% da população brasileira tem algum grau de deficiência auditiva, o que equivale a mais de 10 milhões de pessoas. Destas, aproximadamente 2,7 milhões apresentam surdez profunda, ou seja, não ouvem absolutamente nada.
Tecnologia disponível, mas pouco conhecida
Apesar de já existirem tecnologias que podem melhorar a experiência, como as legendas descritivas, que vão além dos diálogos e incluem descrições de sons importantes, muitas pessoas não sabem que essas opções existem. “Hoje já possuem diversos aplicativos de celular no mercado para legenda, como o PingPlay e MovieReading. Cada distribuidora escolhe um aplicativo para colocar o seu filme e os seus recursos de acessibilidade”, explica Natalia Blandy, coordenadora de produção de acessibilidade e legendas na ETC FILMES. “O meu sonho é ver um cenário onde todo mundo saiba o que está sendo feito”, completa.
Além disso, a Lei de Acessibilidade Audiovisual exige que filmes exibidos em mais de 20 salas tenham audiodescrição, Libras e legendas. Só que filmes exibidos em menos salas não precisam seguir essa regra. Isso significa que uma grande parte do cinema nacional ainda não é acessível para todos. “Por que só os filmes maiores precisam seguir essas regras? A acessibilidade deveria ser garantida para todo mundo, em qualquer sessão”, questiona Natalia.
Como tornar o cinema mais inclusivo?
Um dos caminhos mais simples para aumentar a inclusão no cinema seria a implementação das legendas descritivas nas telas em todas as produções nacionais. Essas legendas não apenas traduziram os diálogos, mas também descreveriam sons essenciais para a compreensão da história, como músicas e efeitos sonoros.
Rodrigo acredita que essa seria uma solução prática e eficiente para tornar a experiência no cinema mais inclusiva e envolvente. “Eu sei que já existem aplicativos de legenda para celular, mas o problema é que a pessoa precisa ficar alternando entre o aparelho e a tela do filme, o que compromete a experiência. Se os filmes brasileiros já saíssem com legendas diretamente na tela do cinema, de forma discreta, todos poderiam assistir sem que isso interferisse na vivência do filme.”
Além disso, campanhas de conscientização sobre acessibilidade e a ampliação das exigências da legislação seriam passos importantes para garantir que mais pessoas pudessem se conectar com o cinema nacional.
“A cultura precisa ser para todos, e os cinemas e distribuidores têm um papel essencial nisso. Não basta a tecnologia existir, é preciso que seja acessível e amplamente divulgada”, conclui Natalia.
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